I
As grandes ondas de imigração italiana começaram a chegar ao Brasil no final do século XIX, mais precisamente na década de 1870. O destino principal dos imigrantes eram as fazendas de café no interior do estado de São Paulo, pois esses pioneiros vinham reforçar – e depois substituir – a mão-de-obra escrava na cultura do produto que gerava a riqueza do país. Alguns italianos eram jovens rapazes solteiros, que vinham tentar a sorte num país estranho mas a maioria eram famílias inteiras, esperançosas de uma vida melhor na nova terra. Vinham de toda parte da Itália, mas principalmente do norte – especialmente Vêneto, Piemonte, Ligúria – onde a chegada da industrialização empobrecera os pequenos agricultores e os pequenos artesãos.
São Carlos, cidade do interior paulista, foi uma das que mais recebeu imigrantes italianos, pois precisava de mão-de-obra para suas lavouras de café, assim como as outras cidades da região de Campinas até Ribeirão Preto. Numa dessas fazendas, os italianos construíram suas casas formando uma vila, numa área entre a Casa-Grande e o cafezal. Os trabalhadores, assalariados, também tinham espaço para plantar mantimentos e criar alguns animais – especialmente galinhas e porcos – para seu sustento. Do café que cuidavam, colhiam e processavam, recebiam o bastante para uso das famílias, mas de nenhum produto havia excedente.
Aos poucos, a população de italianos na fazenda crescia, conforme iam crescendo as famílias. Na virada do século XIX para o século XX, muitas crianças nasceram. Eram brasileiros que tinham mais do que sangue italiano, pois tinham traços culturais italianos, entre eles a língua, a culinária, as festas, os costumes. Brasileiros que só aprendiam o que era o Brasil quando começavam a frequentar a escola. Essas crianças cresciam juntas, andando entre os pés de café, tomando banho no riacho, correndo de mãos dadas no grande pátio atrás da Casa-Grande, onde se secava o café. Nem mesmo o ingresso na escola da vila, onde uma professora dava conta de ensinar a todos as matérias do curso primário, podia separar essas crianças, que seguiam para a escola em grupos de quatro ou cinco, sempre de mãos dadas. Era nessa escola também que estudavam os filhos do patrão que, nessa fase da infância, andavam com os filhos dos colonos, de mãos dadas com eles, brincando e correndo juntos. À medida que as crianças cresciam, porém, as mãos iam se soltando, e os adolescentes passavam a acompanhar mais seus pais no trabalho da lavoura e nos cuidados da casa, preparando-se assim para a vida adulta. Mas duas dessas crianças, quando soltaram as mãos do grupo, não soltaram as mãos um do outro. Continuaram andando juntos, brincando juntos, e, às vezes, voltavam para correr com os menores no pátio, enquanto a vida adulta não chegava de vez. Mas estar com os outros não tinha mais o mesmo significado, e eles preferiam ficar só os dois.
Num dia quente de março, as crianças foram brincar no riacho, que cortava boa parte da fazenda, não longe da Casa-Grande.
– Não é engraçado que todos estejam no riacho e nós aqui, longe deles? -a moça perguntou, em tom descontraído.
O rapaz olhou para o chão, preocupado, e respondeu:
– Não acho engraçado.
Eles estavam no pomar, sentados ao pé de uma árvore, tendo o tronco por encosto. Estavam lado a lado mas, como a árvore não era muito grossa, um não podia ver o outro.
– É só uma maneira de dizer -ela se justificou.
– Além disso, não estamos “longe dos outros”. Estamos “juntos”.
– Isso preocupa você?
Ele não respondeu. Ela desencostou-se e sentou-se ao lado dele.
– Conte-me seus pensamentos.
Ele relutou um pouco mas contou:
– Estamos juntos há treze anos, Rosa.
– Sim, a vida toda.
– Continuaremos juntos o resto da vida?
– Você gostaria?
– Acho que não tenho muita escolha… -e isso lhe parecia um fardo.
– É claro que você tem escolha!
– E como é que eu vou viver longe de você?
Ela sorriu e adivinhou o resto:
– Vamos nos casar, então.
– Acho que não tem outro jeito.
– Você fala como se isso fosse um castigo… -ela ficou decepcionada.
– Quem foi que disse que amar é bom?
– Você não sente a alegria? Só sente o peso?
– Estou preso a você, e um homem precisa ser livre.
– Você é livre, Toni!
– Eu não quero ser livre.
Ela achou graça das falas contraditórias dele.
– Agora conte você o que está pensando -ele pediu.
– Estou muito feliz por saber que sou correspondida.
Ela se aproximou dele, querendo beijá-lo mas ele levantou-se rápido.
– Porca miseria! o que pensa que está fazendo?
– Eu só ia lhe dar um beijo -ela se levantou devagar.
– Nada de beijos: sou muito novo para asusmir compromissos.
– Quem falou em compromisso? Você acha que um beijo vai mudar alguma coisa entre nós?
– Acho.
– Que bobagem. Nossas palavras são mais sinais de compromisso do que um beijo.
– Mesmo assim.
Ela abraçou-o pelo pescoço.
– Eu não acredito que você está morrendo de medo.
– Não é medo.
Rosa aproveitou a proximidade para fazer o que queria, e beijou os lábios de seu companheiro. Toni não tentou se soltar mas procurou não retribuir.
– Porca miseria… -ele disse quando ela tirou seus lábios dos dele.
– Vou considerar que isso significa que você gostou.
Eles ficaram se olhando algum tempo e compreenderam que Toni estava certo: um simples beijo mudava muita coisa.
– Eu não vou me casar com você -ele disse, tentando fugir dos fatos.
– Não agora.
– E se seu pai não deixar?
– E por que ele não deixaria?
– Se outro menino olhar para você, eu nem sei do que sou capaz.
– Eu também não quero você de graça com outras meninas.
– Você disse que um beijo não mudava nada.
– As palavras são mais fortes.
– Não foram palavras que acenderam esse fogo no meu peito -ele abraçou-a apertado- Não são palavras que fazem você ruborizar.
– Pare, Toni. Me solte -ela empurrou-o pelos ombros mas ele não a soltou.
– Você disse que nada ia mudar.
– Eu me enganei! Me solte!
Ele atendeu e eles se afastaram um do outro.
– Eu me enganei -ela repetiu- Me desculpe.
– Se seu pai souber, vai nos proibir de andar juntos. Nunca mais poderemos ficar sozinhos.
– Meu pai não vai saber.
– O pior é que ele vai achar que fui eu que beijei você, que foi minha culpa.
– Ele não vai saber!
– Vamos sair daqui -ele estendeu a mão, pedindo a dela, como sempre fazia.
Rosa olhou para a mão dele, que era companheira da sua a vida inteira, e depois para o rosto dele -os olhos, a boca que há pouco beijara…
– Não me olhe assim…
– O que foi que eu fiz, Toni? Acho que estraguei tudo…
– Estragou o que, Rosa?
– Como eu vou de novo olhar para você sem sentir… sem sentir… esse fogo…?
Ele se aproximou dela:
– A gente já estava se olhando diferente, Rosa. A brasinha já estava acesa há muito tempo.
– Mas agora é um fogo. O que vamos fazer?
– Bem… -ele pensou um pouco e sugeriu- Acho melhor não contarmos a ninguém que estamos noivos.
– Noivos!? -ela se assustou- Mas você nem me pediu a meu pai!
– Ah, é verdade… Então não contaremos que estamos comprometidos.
– Mas, e nós dois?
– Nada muda, esqueceu?
– Mas mudou!
– Mas vamos agir como se não tivesse mudado -ele novamente estendeu a mão para ela- Vamos para o riacho, encontrar os outros.
Ela segurou a mão dele e seguiu-o aonde estava o restante do grupo. Logo que chegaram, um rapaz, de uns dezoito a dezenove anos, veio até eles:
– Onde estavam?
– Não é da sua conta -Toni respondeu e passou por ele. O rapaz segurou-o pelo braço:
– Não me ignore, Toni.
– Não me amole, Paolo: você não é o babbo.
– Sorte sua, senão você ia apanhar agora mesmo.
– Eu já apanho o bastante, obrigado.
– Onde vocês estavam?
– Andando por aí.
– Por aí onde?
– Porca miseria!
– Pare de bestemiar. Você sabe que a mamma não gosta.
– Porca miseria! Eu tenho que aguentar isso?!
– Aposto -Rosa se meteu na briga dos irmãos- como nós dois juntos conseguimos jogar Paolo no rio com roupa e tudo.
– É uma boa ideia, e ele bem está merecendo.
Paolo soltou o braço de Toni:
– Nem tentem.
Toni só olhou para ele e seguiu com Rosa aonde estavam os outros companheiros: os menores banhando-se nus; os maiores brincando apenas descalços com os pés na água, na beira do riacho. Toni e Rosa juntaram-se ao segundo grupo, pois já tinham idade para o pudor.
Somente quando a noite se aproximou, a mãe de alguém apareceu para chamar as crianças para casa. Os maiores ajudaram os menores a se secarem e se vestirem, e todos voltaram para casa de mãos dadas, em grupos de quatro ou cinco. Ao chegarem à vila, despediram-se e cada um entrou em sua casa.
Rosa pediu a bênção do pai ao entrar em casa e foi para a cozinha ajudar a mãe a preparar o jantar.
– Onde estava? -a mãe perguntou.
– No riacho, com os outros.
– E sua irmã?
– Também. Ela já está vindo.
– Tome, lave a salada.
Rosa pegou as verduras para lavar.
– Mamma, a senhora acha que o babbo deixaria eu casar com Toni?
– Casar? Que conversa é essa, Rosa?
– Estamos crescendo. Tenho que casar com alguém, não tenho?
– Mas não precisa ser o Toni.
– Por que não?! -ela se assustou.
– Há muitos outros rapazes melhores do que ele.
– Mas e se… se eu quiser que seja ele?
– Você não vai querer se casar com ele. Ele não será um bom marido.
– Por que não?! -ela arregalou os olhos, surpresa.
– Ele é preguiçoso e desobediente. E tem uma… uma… arrogância… como se ele fosse melhor do que os outros.
– Ele sabe o que quer -Rosa defendeu- e é determinado para conseguir. Não vejo defeito nisso. E ele ajuda o pai igual aos outros irmãos. Se os outros trabalham mais rápido, é porque são mais velhos e mais fortes do que ele. E mesmo que ele brigue e conteste, ele sempre obedece ao pai e à mãe dele, e às pessoas que têm autoridade.
A mãe parou o que fazia e olhou para a filha.
– Você está mesmo pensando nisso seriamente.
Rosa respirou fundo e confessou:
– Eu o escolhi, mamma. É ele que eu quero.
– Ele sabe disso?
– Sabe. E ele também me ama.
– E o que mais, Rosa?
– Mais o que, mamma?
– O que mais você tem para me contar? Conte-me tudo, figliuola, não precisa ter segredos para sua mamma. Ele tentou fazer alguma coisa? Ele lhe faltou com o respeito?
– É claro que não, mamma!
– Mocinhas apaixonadas são presas muito fáceis.
– Mamma, ele é um menino: ele não tem maldade.
– Você é que pensa. Ele começa com uma história de que sente um fogo ardendo no peito e, quando você vê, está desonrada.
– Pare com isso, mamma. Toni não seria capaz.
– Não quero mais você sozinha com ele. E trate de me obedecer, senão conto tudo a seu babbo.
– Tudo o que, mamma. A única coisa importante que eu lhe disse é que quero me casar com Toni.
– E você decidiu isso assim, sem um abraço, sem um beijo? Eu tive a sua idade, Rosa. Eu sei que uma moça não escolhe um marido à distância.
– Dio Santo, nem se eu quisesse fazer segredo!
– Pois muito bem, o que falta você me contar?
– Houve um beijo…
– Eu sabia.
– Mas fui eu, mamma. Fui eu que beijei ele. Ele nem queria.
– Não quero mais vocês dois sozinhos, entendeu?
– Entendi…
Uma menina de pouco mais de dez anos entrou na cozinha.
– Desculpe o atraso, mamma. Fiquei conversando com o Tobias e perdi a hora.
A mãe só olhou para a filha menor. Tinha sido bom crescer solta naquela fazenda, brincando com as outras crianças… Por que agora se preocupava tanto com suas filhas?
– Acho bom vocês duas terem juízo quando estiverem com os meninos. Venha me ajudar com a polenta, Bianca.
Pouco tempo depois, pais e filhas reuniam-se em volta da mesa para a refeição. Não longe dali, a família de Toni também estava jantando e, diferente do habitual, Toni estava quieto e pensativo. Depois da refeição, o pai e os três filhos sentaram-se na sala, enquanto mãe e filha foram lavar e guardar a louça, antes de se juntarem aos homens.
– Está doente, Toni? -a mãe perguntou.
– Não -ele estranhou a pergunta.
– Você está sério demais -ela justificou.
– Ele e Rosa chegaram ao riacho hoje cheios de sorrisos -Paolo contou- Alguma coisa eles aprontaram.
– O que foi desta vez, Toni? -o pai assumiu a questão.
– Nada! Eu não fiz nada!
O pai levantou-se e, com um gesto, mandou que Toni se levantasse. O menino obedeceu e o pai segurou-o pelo braço e levou-o para o quarto. Por já conhecer o comportamento do pai, Toni sabia o que ia acontecer, e foi pelo caminho chorando e repetindo:
– Eu não fiz nada, Babbo! Eu juro, eu juro! Eu não fiz nada!
Quando os dois entraram no quarto e o pai fechou a porta, a mãe brigou com o filho mais velho:
– Está feliz agora?
– Ele merece mesmo apanhar.
– Você tinha que proteger seu irmão, em vez de entregá-lo.
– Proteger? Aí quando o babbo descobre, bate em nós dois. Deixe ele apanhar sozinho.
O pai fechou a porta e soltou Toni:
– Agora conte o que você fez.
– Eu não fiz nada. Desta vez eu sou inocente.
– Então quem fez? A Rosa? Você está acobertando o que ela fez?
Toni se assustou com a pergunta: como ele podia saber?
– O que aconteceu, Toni, para você estar tão sério e quieto?
– Estou pensando na minha vida.
– E o que um menino de treze anos tem para pensar? -ele tirou o cinto da cintura- Se não quer me contar, tudo bem. Mas você sabe o motivo da surra -e levantou a mão para golpear com o látego.
Instintivamente, Toni esticou os braços na direção do pai, numa tentativa vã de se defender, e gritou:
– Eu não tive culpa! Ela me obrigou!
O pai abaixou a mão: a confissão estava vindo.
– O que vocês fizeram, Toni?
– Ela me beijou. Eu não queria, mas ela aproveitou que eu estava distraído e me beijou na boca.
– Rosa beijou você? -ele estava surpreso com a revelação – na boca? Por quê?
– Estávamos conversando.
– Sobre o que?
– Sobre… passar a vida juntos.
O pai pensou no que isso significava e novamente levantou a mão para bater:
– O que você anda fazendo com essa menina, Toni?
– Nada, babbo! -ele novamente ergueu os braços para se proteger- Nunca aconteceu nada. Foi só hoje. E não vai acontecer de novo.
O pai abaixou a mão, desistindo do castigo, e mudou o tom de voz para perguntar:
– O que essa menina está fazendo com você, Toni?
– Não vai acontecer de novo, babbo.
O pai sentou-se numa das camas – era o quarto dos filhos, com três camas, uma para cada um – e chamou Toni para que sentasse a seu lado. Embora receoso, Toni atendeu.
– Sobre o que vocês estavam falando?
– Sobre passar a vida juntos.
– E o que concluíram?
– Vamos nos casar algum dia.
– E então ela o beijou.
– Foi.
– Vocês ainda são crianças, Toni.
– Eu sei, babbo. Foi um acidente. Não era para ter acontecido.
– Vocês não têm idade nem para namorar.
– Eu sei. Ela também sabe. Não vai acontecer de novo.
– Vai, sim.
– Não, babbo. Eu pro-
– Não prometa, Toni. Acredito que não vai acontecer nem amanhã nem depois, nem mês que vem. Mas você não acabou de dizer que vai casar com ela?
– Disse…
– Então vai acontecer de novo, mais cedo ou mais tarde. E é melhor você estar preparado para o que vem depois – para saber o que não fazer… Eu achei que ia cuidar primeiro do casamento da Caterina… E você, logo o mais novo, me dá trabalho primeiro.
– Desculpe, babbo.
– Não faz mal. Bem, vamos começar com a parte que você já sabe: a diferença entre meninos e meninas.
Pai e filho ficaram bastante tempo conversando no quarto, e depois voltaram juntos para a sala. Toni sentou-se ao lado da mãe e o pai chamou o filho mais velho:
– Agora você, Paolo.
– Eu? O que foi que eu fiz?
O pai pegou o filho pelo braço e obrigou-o a levantar-se.
– Primeiro, você acusou seu irmão -e bateu-lhe com o cinto nas pernas- E segundo, a acusação era injusta -e uma segunda chicotada com o cinto.
O pai soltou-o e prendeu o cinto novamente na cintura, enquanto falava aos outros filhos:
– Que sirva de lição para todos: não quero meus filhos brigando ou se acusando. Vocês são irmãos, devem ser unidos.
– Então não aconteceu mesmo nada? -a mãe perguntou.
– Eu e Toni já resolvemos esse assunto.
– Eu não tenho mais idade de ficar apanhando assim -Paolo reclamou- Eu não tenho que aguentar esse tipo de tratamento.
– Eu também acho -o pai respondeu- Mas, enquanto você morar na minha casa, será tratado como eu achar melhor.
– O senhor está me mandando embora, babbo?
– É claro que não! Você já tem idade de ser responsável, em vez de ficar provocando seus irmãos e se envolvendo em brigas de crianças. Enquanto você agir como criança, vai apanhar como criança. Bem, eu vou dormir.
– Eu vou também -a mãe decidiu.
No fim, a família inteira se envolveu em fechar a casa e nos preparativos para a noite de sono. Quando já estavam deitados, a mãe retomou o assunto:
– Você não bateu no Toni. O que aconteceu afinal, Titta?
– Efa, você sabe com quem o Toni está andando? Quem são as companhias dele?
– Os meninos da idade dele, Titta. Os mesmos de sempre.
– Ninguém em especial?
– Bem… Ele passa muito tempo com a Rosa Perrotta.
– A Rosa…
– Filha do Angelo e da Libera.
– Eu sei quem é. O que acha dela?
– Uma menina sem graça como a mãe dela.
Titta riu e contou.
– É melhor você se habituar à ideia de tê-la por nora.
– O que?! -ela se assustou com a notícia.
– Si, Signora Genoefa: il suo nène è innamorato di una bambina noiosa.
– Non può credere… Ele é muito novo para pensar nessas coisas, Titta.
– Isso é o que você acha. Eles trocaram declarações de amor, e se beijaram.
– Dio Santo!
– Ele vai amadurecer mais rápido do que o Paolo, que ainda nem consegue se interessar por uma moça.
– Você acha melhor as crianças não saberem?
– Esse assunto é do Toni. Se ele quiser que mais alguém saiba, que seja ele a contar.
– Você está certo.
– Eu lhe contei para você não ficar preocupada.
– Obrigada.
– Boa noite, Efa.
– Boa noite, Titta.
No dia seguinte, quando Toni e Rosa se encontraram, puderam confirmar que a relação deles estava mesmo diferente, depois de tudo o que tinha acontecido no dia anterior. Não havia medo, nem nervoso. O que havia era a alegria de saberem que ficariam juntos para sempre.
– Contei à mamma o que aconteceu ontem.
– O que ela disse?
– Que não nos quer mais sozinhos.
– Por mim, tudo bem: não pretendo mesmo fazer nada proibido.
– Você contou a alguém?
– Minha mãe me achou estranho. Meu pai achou que eu tinha aprontado e ameaçou me bater, então eu contei tudo.
– Ele não ficou zangado comigo?
– Não. Ele disse que somos muito novos.
– Eu sei.
– E somos mesmo. Ele… ele me contou… todas as coisas da vida.
– Que coisas?
– Ora… a noite de núpcias… e os bebês…
– Oh! Ele contou tudo?!
– Sim. Ele disse que eu preciso saber identificar os sinais no meu corpo… para não lhe fazer mal.
– Ah, que bom.
– Então… mesmo se eu quisesse… eu não tenho idade para isso. Mesmo quando você me beijou, quando eu a abracei, quando falei do fogo… nada disso foi o bastante para… ligar os sinais. Então diga à sua mãe que você está segura comigo, porque eu não consigo… fazer-lhe mal.
– Eu confio no seu caráter.
– Eu não estou falando de caráter, estou falando do meu corpo. Ainda que eu fosse um porco giuda, eu não consigo.
– E o que precisa para conseguir?
– Crescer.
– Há algo que você possa fazer-
– Rosa, eu não vou adiantar as coisas. Meu corpo estará pronto quando estiver. Eu não preciso me deitar com você para ter certeza de que você é minha, e de que será minha para sempre. Eu não preciso de sexo para amar você.
Rosa sorriu, feliz por mais essa declaração de amor espontânea e abraçou-o pelo pescoço.
– Porca miseria, só não vá me beijar de novo! -ele pediu.
– Não. Apenas um abraço de amigos.
Toni abraçou-a também e depois eles se soltaram.
– O que vamos fazer hoje? -ela perguntou.
– Tenho que ajudar o babbo. Francesco ainda está resfriado e a mamma não deixa ele sair de casa.
– Ele é a única pessoa que eu conheço que se resfria no verão.
– Ele vive resfriado. Você vai ficar em casa?
– Vou ajudar minha mamma, então -ela sorriu- Já sei: vou fazer um bolo. Quando você terminar o trabalho, vá lá em casa comer bolo.
Ele sorriu também, aprovando a ideia.
– Vou, sim. Obrigado pelo convite.
– Toni -o pai chamou, a caminho do cafezal.
– Porca miseria, tenho que ir. Nos vemos mais tarde.
– Ciao.
– Ciao.
Passaram-se dias, semanas e meses. A vida seguia sua rotina. O trabalho dos colonos aumentava no inverno, com a colheita e o processamento do café, que amadurecia a partir de maio e, depois de colhido, tinha ainda que ser secado e empacotado para o transporte até a cidade, onde seria torrado e moído, para estar pronto para se transformar na bebida consumida em todas as casas do país.
– O que você acha da vida da sua mãe? -Toni perguntou a Rosa.
– Hein? Como assim?
– Você acha a vida dela boa? Você seria feliz vivendo como ela?
– Que pergunta estranha, Toni. Em que está pensando?
– Tenho passado mais tempo com o babbo nos últimos anos: sem a desculpa da escola, não tenho como escapar do trabalho.
Rosa sorriu, lembrando que sua mãe o achava preguiçoso. Eles estavam sentados na mureta que cercava o grande pátio de secagem do café. Havia pessoas ali em toda parte – já que a mãe de Rosa não os queria sozinhos – mas eles podiam conversar sem serem incomodados.
– Meu pai trabalha muito -Toni continuou- e para que?
– Para você ter o que comer.
– Esse é o problema, Rosa: trabalhamos apenas para comer.
– E não é para isso que se trabalha?
– O que meu pai construiu a vida inteira? Nada.
– Construiu uma família! Você, por acaso, é “nada”?
– Tá, Rosa, mas meu destino é passar a vida colhendo e secando café sem perspectiva de melhorar de vida.
– Não estou entendendo, Toni.
– Eu não quero ter uma vida igual à do meu pai, porca miseria.
– Que vida você quer, então?
– Não sei. Alguma coisa mais parecida com a vida do Diogo, por exemplo, que usa roupas bonitas e não precisa trabalhar.
– Toni, Diogo é o filho do patrão. Ele é o dono da terra.
– Tem que haver algum emprego que me dê condições de dar aos meus filhos uma vida melhor.
– Sua vida não é boa?
– Eu não tenho perspectiva de melhorar, Rosa. Porca miseria, meu destino é repetir o que meu pai e meus avós fizeram, e meus filhos também só terão esse destino. Eu não vejo futuro para mim, só a repetição desse presente. A vida inteira colhendo e secando café, colhendo e secando café… Porca miseria, isso uma máquina pode fazer. Eu quero mais para mim.
Rosa suspirou. Toni não era apenas preguiçoso, rebelde e arrogante como sua mãe dissera daquela vez. Ele era também ambicioso.
– O que pretende fazer?
– Não sei. Tentar a sorte na cidade, talvez.
– E eu?
– Não posso levá-la comigo. Você teria que esperar eu ter um bom emprego.
– Quanto tempo isso leva?
– Não sei. Um ano ou dois, talvez.
– E se você gostar de outra em um ano ou dois?
Ele riu da insegurança dela:
– Porca miseria, acha que sou fiel porque você está por perto? E se você gostar de outro em um ano ou dois?
– Eu não vou gostar de outro.
– Então pronto.
– Vamos nos casar antes de você ir?
– Não, Rosa. Eu vou primeiro, arrumo tudo. Quando eu tiver uma casa e um emprego, eu venho; a gente se casa e você vai comigo.
– Quando você vai?
– Não sei. Não decidi nada ainda.
– Acha que alguém daria emprego a alguém da sua idade?
– É claro! Se tenho idade para trabalhar na roça, tenho idade para fazer qualquer trabalho.
– Você já falou com seu pai?
– Não.
– E se ele não deixar?
– Ele vai deixar. Ele diz que eu só crio problema: ele vai ficar feliz por se livrar de mim.
Toni passou alguns dias pensando em como tratar do assunto com seu pai. Um dia, no cafezal, quando o pai sentou-se para descansar um pouco, e Paolo e Francesco estavam afastados, Toni sentou-se ao lado dele e começou:
– Eu tenho pensado muito na minha vida.
– Que “pensar na vida”, Toni? Você só tem treze anos.
– Porca miseria, não está na hora de eu pensar no meu futuro, e decidir que vida eu quero para mim?
– De onde tira essas ideias, Toni? É a Rosa de novo? O que essa menina está botando na sua cabeça?
– A Rosa só quer casar comigo, babbo. Ela, na verdade, nem gostou quando eu disse que terá que esperar.
O pai fez uma expressão de que adivinhava que não gostaria do rumo da conversa e pediu:
– Va bene! Fale logo.
– Eu não quero ser agricultor. Quero ir para a cidade ganhar a vida de outra forma -Toni foi direto ao ponto.
O pai olhou para o filho muito tempo, tentando entender o que estava ouvindo.
– Por que isso, Toni?
– Porque eu quero melhorar de vida, babbo. E, trabalhando aqui, eu não vejo como.
– E você acha que pode ter uma vida melhor na cidade.
– Acho
– Vamos terminar essa conversa à noite, Toni. Agora vamos trabalhar.
Toni atendeu e eles voltaram ao trabalho. À noite, depois do jantar, quando os homens se sentavam na sala, Titta chamou Toni para a varanda e retomou o assunto da tarde:
– Pensei muito no que você disse hoje, Toni.
– E então?
– Eu sempre acho que o Paolo é o filho que mais se parece comigo, mas você às vezes me surpreende.
– Não entendi.
– Eu também queria outra vida, fazer coisas diferentes, em vez dessa rotina de trabalho. Quando eu fiz dezoito anos, eu saí de casa e fui para São Carlos tentar essa vida nova. Passei dois anos, Toni, sem conseguir nada. Quase morri de fome. As pessoas da cidade não empregam lavradores, Toni. Nosso lugar é aqui. É aqui que nós temos utilidade. Eu tive que voltar, muito humilde, pedir perdão a meu pai, e fazer minha vida aqui.
– O que isso quer dizer?
– Não adianta sonhar, Toni. Nossa vida é esta e pronto.
– Mesmo assim, eu quero tentar.
– Eu não posso deixar.
– Aos dezoito anos, o senhor era um lavrador, babbo. Aos treze, eu sou um aprendiz de lavrador, então posso me tornar aprendiz de qualquer outro serviço. Tenho mais chances que o senhor. Além disso, São Carlos é uma cidade pequena, que vive das fazendas. Eu quero ir para São paulo, que tem indústrias, o governo da província, e a estrada de ferro que vem de Santos.
– Como sabe o que tem em São Paulo? -o pai se surpreendeu.
– Dona Cíntia sempre falava nas aulas. Não vou repetir sua história, babbo. Eu sei que eu vou conseguir.
– Toni, você é uma criança.
– Porca miseria, babbo, me deixe tentar!
O pai pensou um pouco e contou sua decisão:
– Não vai e pronto.
E, para não alongar o assunto, o pai entrou em casa. Quando todos foram dormir, Genoefa perguntou ao marido:
– O que aconteceu para você estar aborrecido?
– Não estou aborrecido…
– Giovanni, io te conoscio.
Ele pensou um pouco e confessou:
– É o Toni.
– Ah, sempre o Toni! O que foi desta vez?
– Ele quer ir para São Paulo ganhar a vida.
– Porco Giuda, o que esse menino tem na cabeça!?
– Calma, Efa! -ele se assustou que ela estivesse falando palavrão.
– Eu vou matar esse garoto!
– Calma, Efa!
– E vou matar você também! isso é maneira de me dar uma notícia dessas?
– Eu já disse a ele que não. Mas precisamos tirar isso da cabeça dele porque, quando ele ficar dezoito anos, eu não vou mais poder segurá-lo, como meu pai não me segurou.
– Por que não contou a ele que você já tentou?
– Eu contei. Mas sabe como os jovens são impetuosos.
– É, eu sei -ela concordou, contrariada- Especialmente os jovens da família Scalzzi.
– Ora, não me culpe. Você bem que gostava. -ele beliscou-a de leve na cintura, fazendo cócegas.
– Você não era meu filho. Eu espero que o Toni não comente o assunto com os irmãos, senão é capaz de os três quererem ir. E o Paolo já tem dezoito anos.
– Paolo gosta da terra, não vai querer ir para a cidade.
– Você é que pensa. Boa noite, Titta.
– Boa noite, Efa.
Apesar do temor da mãe, Toni não falou com os irmãos de seu desejo de tentar a vida em São Paulo. Ele considerava que seus projetos pessoais eram particulares, e não gostava de ficar espalhando suas ideias, nem mesmo para os irmãos. Os companheiros de brincadeiras também iam se distanciando, pois tinham ideais diferentes. Todos pareciam conformados com o destino, subjugados pela rotina, presos à terra com raízes fortes e profundas. Toni às vezes se sentia sozinho, estrangeiros, intruso. Nem mesmo a Rosa parecia entendê-lo, às vezes. Mas como conseguiria soltar a mão dela?
—”—
II
Em janeiro de 1914, Toni e Rosa completaram quatorze anos. A diferença de apenas alguns dias entre o nascimento de um e de outro fazia as famílias sempre comemorarem os aniversários no mesmo dia, no domingo anterior ao aniversário de Rosa, que era a mais novva. A festa do aniversário deles não era diferente das festas que os italianos faziam, pelos mais variados motivos: batizados, casamentos, aniversários, santos de devoção comum. Todos na vila participavam, organizando e executando. As comemorações começavam com um almoço comunitário, em que as mesas eram colocadas enfileiradas no pátio. Depois havia brincadeiras e música para se cantar e dançar e, no final da tarde, bolos e doces para encerrar a festa.
As crianças dançavam juntas, em roda, de mãos dadas como em tudo mais que faziam. Nesse dia, pela primeira vez, Toni chamou Rosa para dançarem só os dois. Embora sutil, era uma declaração pública do compromisso informal, aassumido entre eles no ano anterior. As famílias, que sabiam o que tinha acontecido, percebiam nitidamente como eles se divertiam juntos, e como a presença de um agradava ao outro. As consequências naturais desse tipo de afeição eram óbvias.
Angelo se aproximou de Giovanni e, com um gesto de cabeça, mostrou o casal dançando.
– Acho que vamos ficar parentes -ele comentou, para puxar o assunto.
– Acho que sim -Titta respondeu- Eles não quiseram esperar nós decidirmos nada.
– Eles cresceram juntos. É assim mesmo.
Titta olhou para o amigo, querendo perguntar se ele sabia do evento do beijo mas tinha receio de estar dando a notícia e provocar uma reação indesejada, então disse simplesmente:
– Eles estão mais próximos desde o ano passado…
– Eu sei. As meninas hoje em dia não têm mais juízo. Toni lhe contou sobre o beijo, não contou?
– Contou. E eu contei a ele o que não pode fazer.
– Obrigado.
– Ele pode ser travesso e rebelde, e perder a cabeça com facilidade, mas meu filho tem caráter, Angelo.
– Eu sei, Titta. Lila também tem ficado de olho neles. E, mesmo que ainda não tenham muito juízo, nossos filhos são obedientes. Olhe a cara de felicidade deles quando estão juntos. Deixe-os juntos.
– Quando eles tiverem mais idade, vamos acertar tudo.
– Sim. Por enquanto, é cedo.
Enquanto dançavam, Toni e Rosa se olhavam o tempo todo e sorriam, felizes com o contato físico que, apesar da afeição entre eles, não era prática comum.
– Para quem você vai dar o primeiro pedaço do seu bolo? -Rosa perguntou.
– Para você.
– Não será uma boa ideia, porque eu também quero dar o primeiro pedaço do meu bolo para você.
– Porca miseria, e por que não é uma boa ideia?
– Se nós dois estivermos comendo bolo, quem vai distribuir os outros pedaços?
– Cada um pega o seu.
– Isso não é educado.
– O que sugere?
– Damos o primeiro pedaço às nossas mães, e trocamos entre nós o último pedaço.
– Como sempre fazemos, então.
– Não, Toni. O que sempre fazemos é que eu lhe dou o último pedaço do meu bolo e você come os dois – o meu e o seu – antes de me dar um pedaço do seu bolo.
– Você quer que eu lhe dê o meu pedaço.
– Isso.
– É que eu sempre acho que todos já comeram, então acho que aquele pedaço já é o meu.
– Desta vez, quando você achar que já acabou, lembre-se de mim.
– Ah, Rosa, não é esquecimento.
– Vamos trocar a última fatia como se fosse a primeira.
– Está bem. Devíamos dar a primeira fatia a nossos pais. Sempre damos para nossas mães e elas deixam de lado porque estão cortando as outras fatias.
– É verdade.
– Além disso, precisamos que nossos pais estejam bem felizes este ano.
– Precisamos?
– Sim: seu pai para nos deixar namorar. E meu pai para me deixar ir para São Paulo.
– Vamos começar a namorar este ano? -ela sabia que estava vermelha de vergonha.
– Não sei. Tenho que ver com meu pai. Não precisa ficar vermelha por isso.
– Foi o susto. E… depois… eu não sei como é namorar.
– Ah, eu tenho visto como é, agora que a Caterina está mesmo namorando o Marco.
– E… como é?
– Muito chato. Na verdade, é melhor casar logo, porque, afinal, nós já nos conhecemos bem. Mas acho que seu pai – ou o meu – vai fazer questão que haja um período de namoro.
– É chato, é? Por quê?
– Ah, ela passa a semana inteira ansiosa porque ele vem no sábado. Se arruma toda, faz bolo ou bolachas, e os dois passam a tarde sentados um do lado do outro, se olhando sem graça e rindo. Às vezes, ele fala alguma coisa, e ela faz uma cara como se ele tivesse dito a coisa mais importante do mundo.
– E disse?
– É claro que não! Eu não sei fazer as gracinhas que ele faz, e me sentiria mal em fingir.
– Não podemos namorar diferente?
– Podemos não namorar?
– É claro que não, Toni. Temos que namorar primeiro. Depois ficamos noivos e só então marcamos o casamento e começamos os preparativos.
– Então vamos namorar diferente porque, se você olhar para mim com a cara que a Cate olha para o Marco, é capaz de eu vomitar.
Rosa riu que ele pensasse assim e, como a música tinha acabado, ela pediu:
– Vamos parar um pouco? estou cansada.
Eles desfizeram a posição de dança mas a mão de um continuou segurando a mão do outro, e eles foram procurar o que beber.
– Por que todos nos olham? -ele percebeu.
Ela olhou em volta, para confirmar que eram mesmo alvos de muitos olhares, e respondeu:
– Acho que agora todos sabem.
– Sabem o que?
– Que vamos nos casar algum dia.
– Porca miseria, só porque dançamos juntos?
– Não. Porque perceberam que estamos sempre juntos. Perceberam que crescemos e nos afastamos dos outros, mas nós dois continuamos juntos.
– Só porque continuamos juntos quer dizer que vamos casar?
– Do jeito que você olha pra mim, sim.
Foi a vez de ele ruborizar:
– Porca miseria, de que jeito eu olho pra você?
– Com carinho.
– Que bobagem!
– Você mesmo disse, aquele dia, que estávamos nos olhando diferente.
– Meninas têm olhares apaixonados. Meninos com olhares apaixonados ficam ridículos.
– Então você ficou ridículo.
– Porca miseria, pare com isso! -ele ficou zangado.
– Ah, não me olhe assim. Volte para o olhar apaixonado que eu gosto tanto. Eu não acho ridículo, acho bonito.
– Se os meninos virem, vão rir de mim.
– Você se importa mais com as risadas deles ou com o meu sorriso?
Ele olhou-a nos olhos, recuperando o olhar apaixonado, e sorriu:
– Porca miseria, deixe que riam.
As mães chamaram para os parabéns, que eram cantados em italiano e com tradução para o português, e eles distribuíram o bolo conforme tinham combinado, e trocaram a última fatia entre eles, como se fosse a primeira. Era bom não ser mais criança e poder ter esse tipo de comprometimento e cumplicidade.