Eu gostaria de ser como João Ubaldo Ribeiro, que declarou numa entrevista que só começa a escrever um romance quando o título já está escolhido. Comigo isso raramente acontece: em geral, a história nasce antes do título. Enquanto escrevo a trama, vou pensando num título e, em geral, termino de escrever sem ter chegado a um título, que às vezes só me vem anos depois. Não me angustio mais por isso; aprendi a aceitar mais essa minha limitação e a conviver bem com ela.
Para mim, criar um título, nomear a história, é a parte mais difícil de toda a escrita. Acho que o título deve indicar o objetivo da história, seu resumo, sem contar fatos importantes e menos ainda o final. Também não deve dar pistas óbvias ao leitor do que vai acontecer no decorrer da história, e de características de personagens que só serão reveladas ao longo da história. Além disso, acho que títulos não devem ter verbos, nem devem ser longos. O ideal para mim é uma frase nominal de cerca de quatro palavras, incluindo artigos e preposições. Bem, é nisso que penso quando procuro um título para uma história, mas nem sempre encontro algo que me atenda 100%.
O destino pelo vão de uma janela, por exemplo, tem um título longo demais, a meu ver, mas o nome da história sempre foi Janela, porque é pela janela que a história começa e é pela janela também que começa o fim. E o que está em jogo não é a janela-construção, mas a janela-abertura, a janela-vão: por isso especificar no título o vão da janela. O destino é porque é pela janela que a vida de Marie muda.
O processo de Ser foi chamada pelo nome da personagem principal durante muitos anos. Como essa personagem está buscando se conhecer e se compreender, está construindo sua identidade, a formação de seu Ser está em processo. É um título que atende minhas especificações.
Pelo poder ou pela honra também está de acordo com meus objetivos. Era o título de Primeiro a Honra, que era título de História da vingança do cavaleiro bretão, meu segundo romance de cavalaria. Quando renomeei o romance de cavalaria, mais conforme os autores medievais, o título Primeiro a honra ficou vago, e eu achei que ele estava mais apropriado para a história de Rosala, que também trata de vingança. Já o foco da história de Ninette e a luta pelo poder. Então embaralhei títulos e histórias e cheguei a essa conclusão. O título explica a motivação do conflito principal da história de dois irmãos que brigam pelo poder e, ao verem esgotadas suas possibilidades, continuam lutando em nome da honra. É um título que eu considero de acordo com meus critérios.
Nem tudo que brilha… foi pensado em comparação ao ditado popular que diz que “nem tudo que reluz é ouro”, porque a história trata de falsas aparências. Costumo dizer dessa história que o grande vilão é a vítima, pois é difícil concluir quem afinal é vítima e quem é vilão. O título é enigmático como a história, pois cabe ao leitor descobrir como completar a frase.
O aro de ouro foi fácil escolher, porque é onde se passa a história. É um título completamente adequado aos meus critérios. É curto, sintético e tão explicativo quanto acho que deve ser.
O maior de todos é uma solução que me agrada, mas está fora das especificações, pois à primeira vista se relaciona ao nome de uma das personagens principais, o Conde Legrand, que se poderia traduzir por “o grande”. Mas, ao chamar de O maior de todos, proponho ao leitor que escolha se “o grande” é de fato o maior de todos, ou se outro é maior, nessa história que trata justamente da disputa de poder entre fortes e fracos, entre um jovem rei e seus experientes ministros.
Primeiro a honra foi resultado de uma redistribuição de títulos. Quando eu acho uma frase que serve como título, guardo-a para ser usada quando for apropriada e a reparação da honra perdida é a motivação das ações da personagem principal.
Construir a terra, conquistar a vida é outro título que foge completamente às minhas próprias regras, por ser longo, conter verbos e ser formado por duas frases separadas por pontuação. Mas é o título que expressa o significado dessa Saga luso-carioca. Troquei propositadamente os objetos dos verbos mais óbvios (conquistar a terra e construir a vida), pois não bastava conquistar a terra, foi preciso construí-la sobre charcos e alagadiços. Diante disso, a vida não é uma construção, é uma conquista diária sobre as condições do lugar, sobre a natureza e contra os inimigos.
A noiva trocada é um título simples para uma história simples, que informa o problema principal sem antecipar qual poderá ser a solução. É um título que atende completamente minhas especificações.
Vingança também é um título óbvio, que fala das intenções da personagem principal. A verdade é que fiquei com preguiça de procurar um título mais bonito e pomposo. Talvez eu pense em alguma coisa antes de publicar, então altero o título.
Amor de redenção foi escolhido pensando nos romances de Camilo Castelo Branco “Amor de salvação” e “Amor de perdição”. O amor de que trata meu livro nem salva nem perde, mas é capaz de redimir o que estava perdido. [Editado: essa história foi descartada em 2018, antes de ser publicada.]
Fábrica não tem título. Ainda tenho que pensar em uma frase que fale de relações de trabalho, exploração capitalista, ricos e pobres, e o amor no meio disso tudo. [editado: a história agora se chama Não é cor-de-rosa, e a explicação do título está neste texto]. [Editado: essa história foi descartada em 2018, antes de ser publicada.]
O canhoto também é um título óbvio, que era uma espécie de subtítulo na primeira versão (Mosteiro) e que eu elevei à categoria de título porque resume os dramas da personagem principal: todos os problemas que ele enfrenta na vida decorrem do fato de ele ser canhoto. Como essa informação é dada logo no início, achei que não havia problema já antecipar no título. Confesso que fiquei com preguiça de pensar num título melhor, e um título provisório me angustia menos do que nenhum título. Na hora de publicar, quem sabe mudo também. [Editado: essa história foi descartada em 2022, antes de ser publicada.]
Biblioteca de Kerdeor – Procurei dar aos três romances títulos no estilo dos romances de cavalaria medievais, sem repetir a fórmula. Na época, os títulos costumavam ser longos, contar o final da história (por exemplo, “A morte de Artur”, de Thomas Malory), indicar se a narrativa era em verso ou prosa. Pensando nisso, dei a elas os títulos: 1) Romance em prosa do Cavaleiro de Nova Gália; 2) História da vingança do cavaleiro bretão; 3) Aventuras dos Cavaleiros Cantores. Também seguindo a tradição medieval – agora portuguesa, os três romances “irmãos” são reunidos num volume chamado Biblioteca. “Kerdeor” é como eu imagino que seria Cadorin em bretão, uma vez que o Rei Artur era bretão e seus romances são compostos do que se convencionou chamar de “matéria da Bretanha”.
Nomear contos é mais fácil, pois a trama simples não deixa espaço para grandes dúvidas e devaneios. Com relação aos títulos dos meus contos:
Um dia, depois é um título esquisito à primeira vista, mas foi escolhido porque o casal principal se encontra um dia, depois de anos de separação. [Editado: essa história foi descartada].
História do mundo é a rara exceção em que o título nasceu junto com o texto. É também a única história escrita em primeira pessoa. É a história do mundo contada de um ponto de vista bem pessoal. Quis criar um contraste entre essas duas características: um título bem genérico e abrangente, com uma narrativa bem intimista e pessoal. [Editado: essa história foi descartada].
Labirinto vital – a escolha da palavra “labirinto” foi óbvia, pois é o ambiente em que a história se passa. “Vital” tem mais a ver com a metáfora do significado do labirinto, com toda a simbologia alegórica da história.
O Cisne é um título que, à primeira vista não tem relação com a história, mas o significado dele fica claro no final. Talvez seja o único título que está relacionado ao final da história, e não ao início, nem à motivação. Mesmo assim, cumpre minhas especificações de não antecipar fatos, nem contar o final da história.
À procura é um título que se refere à motivação das personagens, pois todas estão buscando alguma coisa, e a expedição científica de que fazem parte pode ser o momento ideal – ou a última chance, de conseguirem o que procuram. [Editado: essa história também foi descartada].
Oi Monica, tudo bom?
Eu queria conversar com você a respeito de editoras e auto-publicação.
Se tiver um tempo, me manda um e-mail? Estou bem perdido quanto a isso.
Um abraço.
rbruch23@gmail.com