Curiosidade Técnica de escrita

REVOLUÇÃO PAULISTA DE 1924

Chegou a hora de envolver minhas personagens num dos episódios mais violentos da história da cidade de São Paulo, se não o mais violento de todos: o capítulo paulista do Movimento Tenentista, marcado com os “Dezoito do Forte”, no Rio de Janeiro, em 1922, e que continuou depois como Coluna Prestes, percorrendo o Brasil durante muitos anos. Em São Paulo, a rebelião durou 23 dias, e os revoltosos conseguiram efetivamente conquistar a cidade, dominando o Palácio do Governo, os quartéis do Exército e da Polícia Militar, e obrigando o governador a refugiar-se fora da cidade, de onde ele comandou os bombardeios para retomar o poder. Esses bombardeios foram classificados como “terrificantes”, um dos crimes de guerra definidos pela Convenção de Haia em 1917, pois as bombas e granadas eram jogadas sem objetivo certo, “a esmo”, atingindo casas, lojas, fábricas e matando população civil. As baixas militares foram muito pequenas, enquanto mais de 500 pessoas morreram e mais de cinco mil ficaram feridas – isso em números oficiais, que deixaram de ser computados depois que a legalidade venceu a revolta.
 
É claro que Toni vai ver de perto o avanço das tropas – tanto revoltosas como governistas; é claro que ele vai passar noites acordado, temendo que alguma granada caia em sua cabeça. É claro que a pensão de Dona Luizinha, que fica no Brás, um dos bairros mais afetados pelos bombardeios, vai sofrer alguma coisa, com seus moradores – nessas horas, é muito bom ter um grupo de personagens secundários tão disponíveis, para participarem ativamente de todos os eventos (mas, desta vez, ainda não matei nenhum deles).
 
Pesquisando daqui e dali, encontrei o site do Arquivo de São Paulo que trata desse assunto. Traz informações e fotos mas o material mais rico, para meus propósitos, é uma sessão de fontes selecionadas, em que estão listadas as manchetes dos jornais da época. Ora, uma coisa é um texto que diz: “A cidade foi bombardeada durante vários dias”. Certo, quais dias? Toni não pode passar 23 dias com medo das bombas se, na verdade, o bombardeio só começou no décimo dia, por exemplo. Outra coisa é a manchete do jornal de 12/7 dizer: “Efeitos do bombardeio de hontem(sic)”. Ah, isto é informação para o que eu preciso! Agora eu sei que houve bombardeio no dia 11/7. Como vários jornais noticiaram o conflito, cada um com seu ponto de vista, fiz uma tabela comparativa, para não perder nenhum detalhe de informação para cada dia. Depois encontrei um texto de Sérgio Rubens de Araújo Torres, também bastante descritivo do dia-a-dia do conflito, que me deu informações valiosas sobre estratégias, contratempos, teor de panfletos e atitudes individuais das pessoas envolvidas. Meu trabalho agora é contar tudo de maneira informal, em cenas e diálogos. Em vez do narrador dizer: “a população abandonou a cidade”, Dona Luizinha, muito nervosa, vai dizer: “eu não fico mais aqui. Vou embora, pra casa da minha irmã em Campinas. Todo mundo está indo embora e eu não vou ficar aqui esperando a casa cair na minha cabeça”. Pronto: informei que a população abandonou a cidade; que a maioria das pessoas foi para a região de Campinas; que as pessoas temiam ter suas casas destruídas pelas bombas. Tudo em apenas uma fala de personagem, sem a interferência do narrador.
 
A Revolução Paulista é um dos últimos eventos da segunda fase da minha história. Estou quase entrando na terceira fase, já com sentimento de que agora é que a história vai começar de fato. Então, se ainda vai começar, a hora de acabar está muito longe…